A rápida transformação e as conseqüências acarretadas por essa velocidade, vem modificando paisagens e tradições por todo o Rio Grande do Norte - principalmente após a redescoberta da terra poti, no fim dos anos 1990, pelos estrangeiros. Também é sabido que nem todas as mudanças podem ser vistas como benéficas. Porém, essa tendência de esfacelamento da identidade cultural, que assola recantos paradisíacos espalhados pelos quatro cantos do Brasil, está encontrando importante resistência no município de São Miguel do Gostoso, litoral norte do Estado.A preocupação da comunidade em manter – na medida do possível – seus costumes e sua memória acabou despertando interesse no diretor e produtor paulista Eugênio Puppo, da Heco Produções. Puppo apontou sua câmera para a memória histórica da cidade e, desde o início de março, vem rodando o documentário “São Miguel do Gostoso” - ou apenas Gostoso para os mais íntimos.“Conheci Gostoso em 2003, antes desse boom turístico. Tive todo um envolvimento afetivos com a cultura e as pessoas do lugar e percebi o potencial cinematográfico e a importância histórica desse paraíso. Paixão à primeira vista”, disse o diretor por telefone direto de São Miguel, distante 110km de Natal.Puppo não se conteve e voltou no ano seguinte em mais duas oportunidades: “Vim para escrever o roteiro de um outro filme, mas não resisti e iniciei uma pesquisa formal e sistemática sobre essa riqueza sócio-cultural-histórica de Gostoso. Voltei nos anos seguintes e notei que a transformação tinha acelerado espantosamente e decidi que era a hora de começar o documentário”, lembra Eugênio. Além de detalhes da origem da comunidade, o produtor também cruzou informações sobre a Segunda Guerra Mundial e todo o contexto que envolve o município – foi buscar essas histórias a partir de longos depoimentos dos moradores mais antigos. “Os objetivos principais do projeto é o resgate da memória oral e provocar uma reflexão sobre essa nova realidade”, analisa. “Estamos no limite para não deixar a identidade cultural se perder, por isso a necessidade do registro”, aposta. Para enriquecer ainda mais o conteúdo do documentário de 90 minutos, o diretor também irá abordar a tese do professor Lenine Pinto, que defende a possibilidade do Brasil ter sido descoberto na costa do RN.
Parceria localUm dos pilares desse entrosamento com o local é a parceria firmada com o Espaço Tear, coordenado pelo Padre Fábio dos Santos. Para ele, o documentário tem um papel fundamental no que diz respeito a preservação da memória e da identidade do lugar. “A difusão do patrimônio imaterial e material da cultura de Gostoso, bem como a valorização e o reconhecimento dos mestres e mestras (os griôs) do Boi de Reis e do Pastoril são fundamentais para manter a magia e a história do lugar vivas”, explica o padre. “Temos que abrir cada vez mais espaço para os moradores deixarem de ser apenas coadjuvantes e expectadores nesse processo de mudança”, completa.Segundo Puppo, que coletou 67 depoimentos em 32 dias, o projeto não se resume apenas à produção do filme: um livro, uma mostra de cinema e a realização de oficinas de capacitação também fazem parte do pacote. “O lançamento está previsto para março de 2010, durante a Mostra de Cinema, que será repetida anualmente com a exibição de filmes convidados. Minha intenção é transformar essa Mostra em Festival Internacional de Cinema, trazer gente de Hollywood para São Miguel do Gostoso”, planeja.Puppo e o Padre Fábio só lamentam a falta de interesse da iniciativa privada em apoiar o projeto: “Temos total apoio dos comerciantes e empresários locais, comunidade e prefeitura, mas a verba que tenho só dá para captar as imagens”, adianta Eugênio.O projeto recebeu recursos do Programa BNB Cultural de 2007 e 2008, que só representa 20% do total orçado – as leis federal (Rouanet) e estadual (Câmara Cascudo) estão à espera de investidores interessados em colaborar.
Serviço:Documentário São Miguel do Gostoso. Para patrocínios através da Lei Rouanet ou Câmara Cascudo. www.heco.com.br Tel (11) 38710019/(84) 32634313